Ismael, professor do secundário, sentia-se desmotivado pelo que a chamada reforma do ensino lhe havia feito: apesar da sua dedicação e empenho, apesar de ter conseguido puxar por alunos considerados perdidos, apesar de tudo, enfim, durante os próximos 10 anos, o melhor que podia esperar era ter um aumentozito aqui e ali que acompanhasse a inflação.
Algarvio de gema, filho único de pai pescador, que se tinha sacrificado para que o filho “pudesse ter uma vida melhor”, e talvez levado pela sua costela árabe, decidira partir para a guerra.
Após ter descoberto onde votava Sócrates, a quem considerava como responsável pela sua desdita, tinha decidido fazer-se passar por inválido e ir até à assembleia de voto, sentado numa cadeira-de-rodas armadilhada com explosivos.
O plano era simples e consistia em alcançar Sócrates, com o pretexto de o cumprimentar, e nessa altura fazer a cadeira explodir.
Tudo correu como previsto: a segurança afastou-se, a pedido de Sócrates, que vendo uma oportunidade para uma boa foto, não se fez rogado.
Infelizmente para Ismael, o detonador não funcionou e quando se deu conta, estava a apertar a mão a Sócrates e a fazer um sorriso amarelo para a câmera.
Agora, olhava para o engenho e para aquela maldita etiqueta a dizer Made in China e praguejava: “Raios partam mais esta merda!… Nunca mais m’hádes apanhar na loja do chinês!!!”