Quando olhei para as notícias hoje de manhã, foi com imensa tristeza que tomei conhecimento da morte do Manuel Reis.
Tive o privilégio de o ter conhecido pessoalmente. Nunca o conheci intimamente, apenas de conversas fugidias aqui e ali. Ora no Frágil do Bairro Alto ou no Papa Açorda, e depois também no Lux Frágil e no Bica do Sapato.
Sempre que me lembro do Manuel Reis, lembro-me das noites do Frágil, no Bairro Alto, e dos aniversários loucos onde os empregados circulavam com bandejas cheias, porque essas festas eram para o Manuel uma ocasião para a malta se divertir, e não para estar ao balcão a acotovelar-se por causa de um copo.
Entrar no Frágil era (às vezes) uma odisseia. O conseguir passar pela Margarida é motivo de muitas histórias. A minha, normalmente, passava por esperar que o Álvaro, do outro lado da rua, piscasse o olho e desse a sua aprovação. E também houve aquela vez em que, depois de uma nega da Guida, apareceu o Manuel Reis e me disse para entrar. Nunca mais me esqueci.
Fui lendo algumas notícias sobre o Manuel Reis ao longo do dia. E também alguns comentários.
A malta mais nova, pelo que vejo, não tem realmente a noção do impacto que o Frágil teve na noite de Lisboa. Não sabem, não têm a menor ideia, do que era o Bairro Alto antes do Frágil e depois do Frágil.
É verdade que no antes já havia o Bar Artis. E depois o Rock House e o Juke Box. Todos tiveram o seu papel na transformação do Bairro. Tal como Os Três Pastorinhos e o Nova Cafe. E também, mais tarde, o Targus, o Café Suave e vários outros.
Mas, sem sombra de dúvida, o Frágil teve um papel especial. Pela música, pelo ambiente, por toda uma aura de glamour underground, até aí inexistente.
Porque, convém lembrar que o que havia antes disto tudo era um Bairro Alto de tascas, tascas manhosas, não as da moda, das casas de fado e das putas no ataque.
E fora do Bairro Alto, o que havia eram as “boites”. Sítios onde o código de roupa implicava ir “bem vestido” e o que se ouvia era, basicamente, música comercial. Algum rock, muita pop e muito disco dance.
E no Frágil? No Frágil ouvia-se música “diferente”. Também pop e rock, mas sempre numa onda muito alternativa. E havia as decorações, que iam mudando. Desde o início, com os azulejos da padaria que era o estabelecimento anterior e passando depois por mil e uma atmosferas, criadas por artistas e arquitectos convidados.
E… toda uma clientela de artistas, os “conhecidos” e os “artistas malucos”, arquitectos, jornalistas, escritores, wannabes, modelos e… malta que gosta de um copo e boa onda.
E por trás disto tudo, havia o Manuel Reis. Um homem discreto, quase invisível.
Mais tarde em 1998, o Frágil fica para trás e abre o Lux Frágil, em Santa Apolónia, junto ao rio. Onde a boa onda continua, até aos dias de hoje.
Por tudo isto, e por muito mais que fica por dizer… Obrigado Manuel Reis.