A gaivota III

Surpreendeu-me, como sempre. Encontrei-a, ao virar de uma esquina, aqui em Lisboa, numa manhã solarenga de Janeiro.
Desta feita, pareceu-me ainda pior. Duvidei até que estivesse viva. Aproximei-me e vi respirava com dificuldade. Quando me viu, pelo canto do olho semicerrado cumprimentou-me:
– Bom dia Sôr Pericles, como está? – a voz soava arrastada.
– Eu estou bem, mas a amiga parece que está um bocado em baixo…
– Os gajos não perdoam Pericles… descobri muitos podres e fizeram-me a folha – tossiu com força e prosseguiu – Para além do que lhe tinha contado, acredita se eu lhe disser que ninguém consegue arrumar carros nas garagens daqueles andares de que eu falava, a não ser que tenha um Smart?
Arregalei os olhos, surpreendido com mais aquela e a gaivota, esboçando um meio sorriso, prosseguiu a custo:
– Oiça, não me resta muito tempo. Há para aí tanta coisa, tanto gato escondido com o rabo de fora…Prometa-me que vai continuar com a sua escrita. É o que nos resta contra estes gajos todos!… 
Prometi-lhe que sim. Continuarei, fique descansada.

O cartaz de Manuel Alegre

O Muito suave apanhou a conversa seguinte entre Manuel Alegre e José Socrates
J.S.: Ó Manel, achas que vai mesmo haver segunda volta?
MA: Para dizer a verdade… acho que não Zé, mas não faz mal.
J.S.: Como assim, “não faz mal”?
MA: É que, se o Cavaco ganhar logo à primeira, já tenho uma ideia para aproveitar os cartazes…
J.S.: Hein?!…
MA: Ora vê lá. Estás a ver este meu cartaz, o da “Garantia”?
J.S.: Sim?…
MA: Então agora vê lá a RECICLAGEM que eu lhe vou fazer!…
J.S.: Manel, mas tu tens a certeza que queres mesmo vender as Purdeys?!…
MA: Zé… eu já nem posso ver a porra das Purdeys à minha frente!!!

Pormenor?

Na 6ªfeira da semana passada, fui ver “O Senhor Puntila e o seu Criado Matti” ao Teatro Aberto.
A peça está muito bem encenada e as interpretações são boas. Valeu a pena.

De seguida, eram umas onze da noite, subimos ao Pano de Boca, o restaurante-bar do Teatro Aberto, onde se pode comer comida alemã muito boa, já agora.

Após cada um ter bebido uma weissbier, pusemo-nos a caminho do carro, que tinha ficado na rua da mesquita da Praça de Espanha.

Subimos umas escadinhas junto à mesquita e foi nessa altura que “tropecei” neste cartão.

Apanhei-o pensando que um cartão, ainda por cima um cartão da Caixa Nacional de Pensões, é sempre algo que faz falta a alguém e que tentaria devolvê-lo. Tentei fazê-lo, posteriormente, mas não consegui localizar o seu dono, o Sr. Octávio José Faria Rodrigues. Irei encaminhar o cartão para a Polícia; suponho que terão maneira de o fazer chegar ao seu dono.

Ao ler os dados do cartão, reparei num pormenor: o Octávio Rodrigues nasceu em Fevereiro de 1958 e a data de admissão na Caixa Nacional de Pensões é de Agosto de 1970.

Isto significa que o Octávio Rodrigues começou a trabalhar quando tinha doze anos.

Olhei para a fotografia de novo, com mais atenção, e comprovei que, de facto, é a cara de um miúdo de doze anos.

Fez-me pensar um bocado.